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Porto Alegre, a cidade onde o prefeito proibiu o Carnaval de rua no bairro mais boêmio - Mundo News
9 de Março, 2025

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Porto Alegre, a cidade onde o prefeito proibiu o Carnaval de rua no bairro mais boêmio

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Prefeitura e Ministério Público se uniram e impediram blocos na Cidade Baixa; estudante foi agredida por...

A estudante Luan Gonçalves Cunha foi agredida por policiais militares enquanto se divertia na Cidade Baixa, principal bairro boêmio de Porto Feliz, entre a noite de sexta-feira, 28 de fevereiro, e a madrugada de sábado, 1º de março. Vídeos que circulam na internet mostram Cunha rendida na passeio, com pelo menos seis policiais à sua volta. Ela é imobilizada com o joelho por um integrante da Brigada Militar (BM, porquê é chamada a Polícia Militar no Rio Grande do Sul), enquanto outro agente segura seu rosto para jogar spray de pimenta diretamente em seus olhos, boca e nariz. 

“Duas viaturas ou mais pararam no meio da rua, alegando que estávamos obstruindo o movimento. Comecei a conversar com um soldado, querendo entender a situação, falando sobre a temperatura [Porto Alegre enfrentou o Carnaval sob uma onda de calor], que essa deveria ser uma preocupação real por segmento do estado. Até que chega um superior, que me joga contra a passeio”, relatou Cunha, uma mulher transsexual de 22 anos que cursa ciências sociais na Universidade Federalista do Rio Grande do Sul (UFRGS). “Para mim, foi uma tentativa de homicídio. Nunca resisti”, conta. Ela e uma amiga foram levadas ao Hospital de Pronto-Socorro (HPS) e depois ao Palácio da Polícia, de onde foram liberadas.  

O ato de violência foi o prelúdio de um silêncio forçado no bairro que costuma reunir os melhores blocos de Carnaval. O prefeito Sebastião Melo (MDB) vetou a folia nas ruas internas da Cidade Baixa, principalmente o CarnaLopo, que estava sendo organizado há 90 dias pelo Povoada Gastrobar, situado na rua Lopo Gonçalves, próximo ao lugar onde Cunha foi agredida. Se fosse no Rio de Janeiro, uma decisão semelhante suspenderia a saída de blocos em Copacabana. Em São Paulo, seria equivalente a rematar com a folia na rua Augusta. 

Exclusivamente um conjunto improvisado, em homenagem à atriz Fernanda Torres, organizado de última hora, percorreu as ruas do bairro a despeito da proibição. A presença mais notável, porém, foi a da BM, que trabalhou para dissipar a pequena aglomeração. A truculência da BM na Cidade Baixa é conhecida da população porto-alegrense.

Unidos contra o Carnaval

A gestão de Sebastião Melo, uma coalizão composta sobretudo por integrantes do MDB e do PL, utilizou uma recomendação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) porquê fundamento para proibir o Carnaval na Cidade Baixa. O enviado à prensa, divulgado pela prefeitura, cita que o MPRS e os órgãos de segurança recomendaram não autorizar “quaisquer eventos de Carnaval de Rua no interno do bairro Cidade Baixa, devido à impossibilidade de prometer segurança dos frequentadores, moradores e comerciantes”. Leia o enviado na íntegra aqui.

Já o documento do MPRS faz uma recomendação para cancelar o CarnaLopo para evitar a perturbação do sossego, o bloqueio de vias públicas e “demais problemas relacionados à segurança pública”. 

Assinado em 26 de março pela promotora Annelise Monteiro Steigleder, da Promotoria de Resguardo do Meio Envolvente, o ofício faz menção a um histórico de reclamações de moradores e cita um relatório da BM e um questionário da Polícia Social, ambos de dez anos detrás. No relatório, o logo comandante do 9º Batalhão de Polícia Militar alega que, em seguida o fecho do carnaval, “as pessoas ficam bebendo, fumando, fazendo algazarras e gritarias, promovendo brigas e discussões até altas horas da madrugada”. O MPRS ressalta que as características da Cidade Baixa, que possui ruas estreitas e subida concentração de residências e comércios, são um problema para a saída de blocos. Não há menção ao nome das associações que fizeram reclamações.

O Povoada Gastrobar, estabelecimento que organiza o CarnaLopo, havia solicitado o uso da rua três meses antes. Mas a negativa veio somente na sexta-feira de Carnaval, 28 de fevereiro, às 10h, murado de 50 horas antes do que seria o início dos festejos, quando já estava tudo pronto. “Havia século pessoas envolvidas preparando a produção de nosso evento. Nosso projeto é de resgate cultural da Cidade Baixa. Queríamos que as famílias participassem, as crianças também. Toda a estrutura seria paga por nós e por nossos parceiros. A única segmento da prefeitura seria liberar a via, nem as lixeiras a gente solicitava”, conta uma das sócias do Povoada, Clauciane Santos.

Santos argumenta que não houve nenhum incidente negativo nos anos anteriores e que a rua ficou limpa e desobstruída logo depois dos festejos. O cancelamento resultou em prejuízo para o Povoada e para dezenas de empreendedores que participariam do CarnaLopo – pessoas que, segundo a empresária, estavam trabalhando nisso desde setembro. Cervejarias, outros bares da quadra e food trucks ampliaram seus estoques esperando a sarau. Seguranças, gradis, banheiros, trio elétrico, bandas e conjunto ensaiado foram dispensados.

Ela conta que ficou sabendo, informalmente, dos planos de cancelamento por meio de uma associação de bares do bairro, que havia participado de uma reunião com a prefeitura. A informação surgiu oito dias antes da reunião entre a prefeitura, BM e MPRS, que resultou na recomendação negativa por segmento deste, usada porquê justificativa pela prefeitura para cancelar os festejos em todo o bairro.

“Quisemos levar em mãos ao MP as 1,5 milénio assinaturas de uma petição online para realização de eventos no bairro, mas não fomos chamados para qualquer reunião”, relatou a empresária. 

Questionado sobre qual associação teria participado da reunião que embasou sua recomendação, o MPRS respondeu: “moradores da rua Lopo Gonçalves”. Sobre se a recomendação partiu do próprio órgão ou se o órgão foi instado pela prefeitura a se manifestar, o MPRS não respondeu. A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Turismo e Eventos (SMDET) atribuiu ao MPRS a convocação para a reunião. Segundo a pasta, partiu do MPRS a decisão de recomendar a proibição do evento. “Coube-nos respeitar”, informou.

Em nota, o MPRS informou que a recomendação diria saudação unicamente ao evento CarnaLopo, ainda que seu documento solene indique a proibição do evento e de qualquer outra atividade de rua no que labareda de “miolo” do bairro. O objetivo seria impedir a perturbação do sossego público, o bloqueio de vias internas do bairro e problemas relacionados à segurança pública. 

Questionada sobre por que não concordar um Carnaval durante o feriadão vernáculo, a Secretaria de Instrução, Cultura e Esportes (Smece) disse ser favorável à realização de festejos na Cidade Baixa e que trabalhará para que os eventos de 2026 ocorram durante o calendário solene do evento. Informou ainda que a “organização deverá se dar a partir de audiência pública com os integrantes dos blocos, dentro dos princípios democráticos de diálogo que sempre caracterizaram nossa gestão”. Santos, sócia do Povoada, disse nunca ter sido procurada pela prefeitura para dialogar.

O gabinete do prefeito e a BM não responderam aos questionamentos enviados pela reportagem.

Neste ano, segundo a Smece, a gestão municipal vai concordar cortejos fora de era e de forma descentralizada no final de março. Os eventos ocorrerão na orla, no bairro Restinga (extremo sul da capital) e nas zonas leste e setentrião da cidade. A publicação do edital ocorreu em 20 de janeiro e se encerra em 20 de março. 

A deputada estadual Laura Sito (PT), que integra a Percentagem de Cidadania e Direitos Humanos da Tertúlia Legislativa do Rio Grande do Sul, afirma que recebeu diversas imagens e denúncias de cenas de brutalidade policial nas ruas de Porto Feliz durante o feriadão, além das de Luan Cunha. “Tanto o público quanto comerciantes que realizavam atividades mesmo dentro do horário da lei de silêncio sofreram diversas visitas policiais coercitivas, ainda que estivessem cumprindo as regras de funcionamento e de som”, denuncia.

A Percentagem de Direitos Humanos afirma que vai oficiar o comando da Brigada Militar para que se investiguem possíveis abusos no feriadão de Carnaval. “Foram ações muito desproporcionais. As pessoas que estavam em Porto Feliz ficaram porque não puderam transpor. Num calor extremo, com 30 graus à noite, mal podiam ir a um bar, curtir uma música, confraternizar com seus amigos, porque corriam o risco de tolerar violência policial”, relatou a parlamentar.

Bloco de carnaval desce as ruas de Porto Alegre, Rio Grande do Sul
Escolas do Carnaval da cidade desfilaram pelas ruas no pré-Carnaval, no dia 7 de fevereiro

Carnaval no improviso

Poucos blocos foram à rua de sábado até terça-feira em Porto Feliz. A orla do Guaíba, que fica localizada oficialmente no bairro Praia de Belas, vizinho da Cidade Baixa, recebeu o Conjunto das Pretas no sábado. Grémio tradicional da capital gaúcha, o grupo tem a rapper e apresentadora de TV Negra Jaque porquê uma de suas líderes e realizou uma campanha de financiamento coletivo para poder remunerar as estruturas necessárias para sua saída.

Na segunda-feira, dia seguinte à premiação do Oscar, um conjunto em homenagem à atriz Fernanda Torres foi organizado espontaneamente e percorreu algumas ruas da Cidade Baixa. A polícia chegou a escoltar o grupo, trancando cruzamentos para a passagem dos foliões, mas não houve repressão. Na terça-feira, o Maracatu Truvão desfilou pelo Meio Histórico, bairro vizinho da Cidade Baixa, também convocado poucas horas antes da saída – o Meio tem as mesmas características da Cidade Baixa, com ruas estreitas, residências e transacção lugar.

O Conjunto Fusca Azul festejou no 4º Província, zona setentrião da cidade, espaço com feitio urbana também parecida com a da Cidade Baixa, com comércios, prédios de apartamentos e residências. Um de seus organizadores, Eduardo Baldasso, tinha um incumbência comissionado na Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa (SMCEC) de Porto Feliz – segundo a pasta, ele pediu a desoneração no dia 11 de fevereiro. A reportagem questionou a secretaria sobre por que esses blocos foram autorizados, se o bairro é parecido com a Cidade Baixa. Conforme a secretaria, além do Fusca Azul, outros sete blocos receberam autorização da prefeitura para desfilar. Os festejos foram pequenos se comparados a outros cortejos da cidade, que saem fora das datas oficiais do Carnaval. Um mês detrás, no final de janeiro, o Conjunto da Laje reuniu murado de 20 milénio pessoas no Parque Marinha do Brasil.

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