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O caso do jovem inocentado graças a GPS da viatura policial - Mundo News
22 de Fevereiro, 2025

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O caso do jovem inocentado graças a GPS da viatura policial

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Registros do serviço de telemetria veicular comprovaram versão do acusado, que foi absolvido após nove meses...

O motorista de aplicativo Yago Mariano da Silva, um jovem preto de 25 anos, deixou o Núcleo de Detenção Provisória (CDP) de São Vicente, no litoral paulista, onde passou nove meses recluso por um transgressão que, durante todo esse tempo, afirmou não ter cometido. Silva foi réprobo por tráfico de drogas, mas terminou sendo absolvido por uma reviravolta no processo. Os policiais que o prenderam não usavam câmeras, mas, com os registros de deslocamento e o GPS da viatura, a resguardo conseguiu indicar indícios de que os agentes teriam implantado drogas em uma abordagem para incriminá-lo.

Em 5 de novembro de 2024, Silva deixou a prisão. A sentença que o inocentou só foi verosímil porque a resguardo dele solicitou à Polícia Militar (PM) o serviço de telemetria veicular – equipamento que permite o monitoramento da viatura onde estavam os policiais militares que fizeram a abordagem do motorista de aplicativo. Os PMs afirmavam que tinham levado o réu diretamente para a delegacia, mas o registro do caminho feito pela viatura era dissemelhante. 

Ao confrontar os registros divergentes, o juiz Rodrigo Barbosa Sales, da 3ª Vara Criminal de São Vicente, defendeu a sentença de remissão da seguinte forma: “Nota-se que o relatório de trajecto de viatura […] apontou o trajeto percorrido às 13h39, horário da ocorrência. Ao contrário do que afirmou a testemunha de delação, os policiais não foram diretamente ao 3º Província Policial depois a prisão do réu”. 

De pacto com Silva, a prisão aconteceu no dia 4 de março de 2024, quando ele saiu para comprar leite a pedido da esposa. Posteriormente ter pretérito pelo mercado, optou por encomendar uma marmita para que pudesse almoçar com a família em seu dia de folga. Na fileira da lanchonete, que fica no intercepção da rua Sorocaba com a avenida São Paulo, ele escutou o estrondo de uma porta de carruagem se perfurar. Era uma viatura da PM, de onde desembarcaram os policiais militares tenente Rômulo Lima Porto Tardan e soldado Marcos Antônio da Silva Santos. 

O tenente Tardan foi quem fez a primeira abordagem. Segundo Silva, o policial perguntou onde ele morava e a localização do ponto de venda de drogas da comunidade onde ele vive, o Parque Continental, em São Vicente. “Eu respondi pra ele: ‘Eu não sei, doutor, não sou usuário e nem vendo droga, estou cá unicamente pra comprar marmita’. Mas eles [PMs] não acreditaram”, disse.

Silva disse que os policiais insistiram em saber quem eram os traficantes e quem domina o tráfico de drogas na comunidade. Mais uma vez, o motorista respondeu que não sabia. “Eles [PMs], portanto, falaram assim: ‘Você acha que nós somos bestas? Nós não somos bestas, não. Tu sabe muito muito quem é’. Aí eles puxaram o meu nome e falaram que iam me levar pra uma devassa [na delegacia]”, contou o motorista. 

Uma das alegações dos policiais para levar Silva à delegacia era que ele estava sem documentação no momento da abordagem. “Eu falei que não tinha premência [de ir para a delegacia], que, se ele quisesse, a minha esposa apareceria com o meu documento. Ele falou assim: ‘Não, não precisa não! Não é tu que vai ensinar a fazer o nosso trabalho não’”, disse.

Por que isso importa

  • A história do motorista que conseguiu provar sua inocência graças aos registros da viatura policial representa os muitos casos de reconhecimento equivocado de suspeitos, que levam à prisão de pessoas inocentes no Brasil.
  • Assim porquê Yago Mariano da Silva, as maiores vítimas dessas falhas da Justiça são jovens negros, de pacto com o Fórum Brasílio de Segurança Pública.

PMs levaram motorista para terreno baldio

Dentro do chamado “camburão” da viatura, o trajeto feito pelos policiais militares despertou a preocupação do motorista. Finalmente, o caminho não parecia ser para a delegacia mais próxima, que fica a nove minutos do sítio onde a abordagem aconteceu. A paisagem, ao longo do trajeto, era pouco urbana e repleta de matas. 

Quando finalmente a viatura parou, os policiais desembarcaram Silva em um terreno baldio, numa superfície conhecida porquê “invasão” por ter sido ocupada de forma irregular por famílias de baixa renda do bairro Rio Branco, a três quilômetros de intervalo do sítio da abordagem. 

Ali, ele teria sido uma vez imposto a responder a perguntas. “Eles [PMs] disseram que só iam me liberar se eu desse uma arma pra eles ou uma lar com drogas”, contou. “Portanto, eu falei: ‘Não tem porquê eu indicar para o senhor uma lar [com drogas], eu não sou envolvido com zero, não tenho essa informação para o senhor, eu sou trabalhador”, disse Silva. 

Sem trazer as respostas e a arma que os policiais tanto pediam, Yago Mariano da Silva disse que foi levado de volta ao camburão e direcionado à delegacia depois de meia hora de conversa, por volta das 14h15. 

Silva não foi ouvido na delegacia  

Demorou três minutos, diz Silva, para que os policiais chegassem até o 3º Província Policial (DP) de São Vicente. Quando a viatura parou no estacionamento, o motorista foi levado para a cubículo do DP, onde ficou até que os PMs fizessem a suposta devassa. No entanto, os policiais militares apresentaram uma ocorrência de tráfico de drogas na delegacia. 

Segundo o Boletim de Ocorrência (BO), Silva estava com uma sacola entre as pernas e nela havia porções de maconha, cocaína e crack, além de R$ 313 lucrados por meio de tráfico de drogas. O documento afirma que o motorista teria confessado o transgressão, um pouco que Silva nega. “Questionado, o quidam confessou aos policiais que estava no sítio realizando o transacção de substâncias entorpecentes”, diz o documento fundamentado na versão apresentada pelos policiais. 

A prisão em flagrante foi anunciada horas depois. “Passou um policial e eu perguntei o que estava acontecendo. Portanto, ele falou assim: ‘Tu tá vendendo droga e tu não sabe o que está acontecendo? Tá dando uma de louco?’”, disse Silva. Surpreso com a informação, ele respondeu: “Mas eu não estava vendendo droga. Eu não estava fazendo zero, eu estava unicamente pegando a marmita. Aí ele [policial civil] falou: ‘O policial apresentou as drogas e amanhã tu vai pra audiência de custódia’”.

À Filial Pública, Yago Mariano da Silva contou que não prestou prova ao representante e ficou o tempo todo na cubículo da delegacia, aguardando o desfecho da devassa que os PMs haviam anunciado. 

O representante que assina o BO e optou por estatuir a prisão em flagrante de Yago da Silva é Norberto Donizeti Bergamini, um representante experiente da Polícia Social de São Paulo, que atua há mais de 30 anos na instituição e chegou a receber o título de “Policial Nota 10”, durante o governo de João Doria Junior (2019-2022), com homenagens no Palácio dos Bandeirantes, a sede do governo paulista. 

Surpreso e inconformado com  versão apresentada pelos policiais militares, restou a Silva unicamente esperar pela audiência de custódia, que ocorreu no dia seguinte à prisão, na qual o juiz optou por transmudar a prisão em flagrante em preventiva sem que, novamente, ele tivesse a oportunidade de racontar a sua versão da história.

“Na audiência de custódia, eu nem consegui falar. O juiz só perguntou onde eu estava, a minha idade e onde eu trabalhava”, disse o motorista. 

Por nove meses, a única forma que Silva teve para falar com a sua família foi por cartas, que levavam, em alguns casos, até um mês para chegar. As visitas da esposa e da filha, na era com um ano, aconteciam poucas vezes. Sem o serviço dele, a família passou dificuldades. Sua esposa teve que restituir a lar que alugava e voltar a morar com a mãe.

Reviravolta no caso 

Quando o motorista de aplicativo encontrou o jurista Renan Lima Lourenço Gomes, o seu primeiro pedido foi para que ele solicitasse as imagens das câmeras corporais, que poderiam atestar a sua inocência. Recentemente, uma decisão do ministro do STF Luís Roberto Barroso obrigou a PM de São Paulo a usar as câmeras corporais nas periferias e em ações policiais. “A câmera corporal ia ser a prova concreta que eu não estava com zero”, contou Silva. 

O jurista fez o requerimento das câmeras corporais, conhecidas porquê body cams, usadas por secção do efetivo da Polícia Militar de São Paulo. No entanto, os policiais militares do 39º Batalhão da PM do Interno (BPM/I) não tinham o equipamento na era. 

Lima disse à Pública que a opção foi fazer o pedido do sistema de rastreamento da viatura. “Eu vi em um dos regimentos internos [da PM] que existe um sistema de telemetria, que é o sistema vinculado entre a viatura e o GPS. Portanto, isso não tem porquê eles [PMs] desabilitarem. Até conseguem desabilitar o horário, mas não a latitude e lonjura. Eu fiz essa solicitação no processo, eu pedi pro juiz me dar autorização desse sistema de telemetria e o doutor autorizou”, contou o jurista. 

Ao ter aproximação aos endereços de circulação da viatura no dia e hora em que Yago Mariano da Silva foi abordado, o jurista teve uma surpresa: além de ter sido desviada a rota até a delegacia, os policiais teriam desligado o GPS da viatura por 32 minutos, enquanto estavam com o motorista de aplicativo no terreno baldio. 

Ele avalia que “por uma ação de preterição, pela forma com que os policiais fizeram essa abordagem, eles acabaram dificultando a vida do Yago. E se eles tivessem exercido o obrigação permitido, teriam evitado o espavento psicológico [na vida do Silva]”.

Na audiência que deu a liberdade ao motorista, o juiz apontou o vestimenta de o GPS ter sido desligado, mas que o sistema de monitoramento eletrônico da viatura acusou o endereço do terreno baldio, o que coincide com a versão de Silva. Ou por outra, os policiais foram questionados, em raciocínio, se reconheciam o sítio descampado para onde levaram o motorista, mas negaram.

“Tudo a corroborar em secção as palavras do réu e de sua testemunha, assim porquê a tese defensiva”, escreveu o juiz Rodrigo Barbosa Sales, na resguardo da sentença. 

Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP), sob a gestão do secretário Guilherme Derrite, se limitou a responder que “o caso mencionado foi investigado no 3º DP de São Vicente. Posteriormente a adoção de todas as medidas de polícia judiciária cabíveis, o sindicância policial foi relatado para avaliação da Justiça” e que qualquer denúncia sobre a “conduta dos agentes envolvidos pode ser formalizada junto às corregedorias das polícias Social e Militar, a termo de que os fatos sejam devidamente investigados”.

Para a pesquisadora sênior do Fórum Brasílio de Segurança Pública Juliana Brandão, o sistema jurídico penal brasílico aponta para um perfil de seletividade em suas condenações. “Preferencialmente, a gente está falando dos homens negros e jovens. É esse perfil que geralmente sofre a primeira abordagem e que é um cliente preferencial do sistema jurídico penal no Brasil e que nos conecta com o debate mais vasto de que a gente está lidando com os atravessamentos do racismo estrutural dentro do sistema penal”, explicou.

Agora que está em liberdade, Yago Mariano da Silva terá a oportunidade de comemorar o terceiro natalício da filha. “Faltavam poucos dias para o natalício da minha filha, eu estava sendo injustiçado por uma coisa que eu não estava cometendo […] Agora, no natalício da minha filha quero fazer uma festinha.” 

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