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Terra e corpo em risco: violência mais que dobra quando a vítima é mulher indígena no MA - Mundo News
22 de Agosto, 2025

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Terra e corpo em risco: violência mais que dobra quando a vítima é mulher indígena no MA

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Levantamento mostra que em 2024 agressões contra mulheres indígenas foram 145% maior do que em não-indígenas...

Uma mulher indígena tem 2,4 vezes mais chance de suportar qualquer tipo de violência do que uma mulher não-indígena no Maranhão. Quando tratamos de dados absolutos, o índice de violência contra mulheres no Estado é de 117,5 por 100 milénio habitantes. No caso das mulheres indígenas, são 288 vítimas a cada 100 milénio, ou seja, um valor 145% maior.

A violência não atinge somente as indígenas com mais frequência. Os dados relacionados à população universal do estado apontam 89 casos a cada 100 milénio habitantes. Para a população indígena porquê um todo, o índice sobe para 157, uma diferença de 75%. As informações são do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), ligado ao Ministério da Saúde e relativos a 2024. O sistema é manteúdo por informações colhidas por agentes da Saúde, considerando a autodeclaração do quidam. 

Os números da violência contra indígenas no Maranhão incluem quatro feminicídios registrados em 2024. Neste ano, houve mais uma ocorrência, no mês de janeiro. Além dos assassinatos, foram anotados casos de estupro, de violência doméstica e de lesão corporal.

Por que isso importa

  • Em 2024, 211 indígenas foram assassinados no Brasil, sendo 52 mulheres. O oferecido é do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil (Cimi).
  • Foram 37 ataques violentos contra comunidades indígenas registrados em 11 estados do país, segundo o mesmo relatório.

Agressão contra corpos e territórios é a mesma

Segundo a professora de sociologia Ana Caroline Amorim, da Universidade Federalista do Maranhão (UFMA), são os anos de colonização repleta da lógica do patriarcado ocidental que invade as aldeias e transforma os modos de vida dessa população. “Muito porquê a compreensão da violência de gênero, uma vez que nas sociedades indígenas a separação sexual do trabalho se faz de forma complementar”, mas está sendo atravessada pelas hierarquias que historicamente foram impostas aos povos originários. 

Pjhcree (lê-se Picrê) Akroá Gamella, que se autodenomina uma defensora popular das mulheres indígenas, acredita que essa violência é um sintoma do mesmo fenômeno que envolve a invasão de territórios, o desmatamento, o intoxicação por agrotóxicos e o desrespeito às tradições. Para as mulheres indígenas, corpo e território são uma coisa só. 

“Se uso um trator e reviro a natividade da juçara que existe há décadas no meu território, escavei um buraco na bojo de uma mulher e de um monte de rapaz ao tirar a maior natividade de alimento delas. Quando compro um monte de búfalos e coloco no campo onde eu e meus filhos pescamos, matei não só os meus filhos, mas os filhos de outras mulheres”, afirma Pjhcree.

Esse entendimento, que amplia a definição de corpo e abrange as agressões ao território, é “difícil de ser acessado por não-indígenas”, segundo a avaliação de Ana Caroline Amorim. 

Para Pjhcree Akroá Gamella, a violência tem se espalhado porquê forma de adoecimento dos corpos e dominação dos territórios, que, mais uma vez, se mostram porquê uma coisa só.

É o que também explica Taynara Caragiu, enfermeira indígena e responsável técnica do Polo-Base do município de Santa Inês. Para ela, os efeitos da colonização se manifestam nas invasões e explorações territoriais estabelecidas e organizadas de forma hierárquica e violenta, mantendo as populações indígenas, em privativo as mulheres, em situação de vulnerabilidade. “A violência não é da cultura indígena, mas resultado do machismo do patriarcado, que é resultante da colonização”, avalia a enfermeira. 

O Polo-Base de Santa Inês faz secção do Província Sanitário Privativo Indígena (DSEI) do Maranhão. O província é formado por seis polos-base e 37 equipes (compostas por profissionais porquê enfermeiro, técnico de enfermagem, agente indígena de saúde, agente indígena de saneamento, médico e dentista). Esse número, entretanto, não alcança toda a população autodeclarada indígena do estado. Apesar de a Política Vernáculo de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI) prever um atendimento especializado por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), quem não está nos territórios especificados, ou em áreas urbanas, acaba sem atendimento.

Subnotificações agravam problemas

Os números levantados pelo Sinan relacionados à violência contra mulheres indígenas em 2024 podem estar subnotificados, segundo a Secretaria de Segurança Pública do Maranhão. No mesmo período, o órgão registrou 184 Boletins de Ocorrência com denúncias da mesma natureza. Ou seja, quase o triplo dos informados no sistema do Ministério da Saúde. 

Essa diferença entre os registros é causada por vários fatores. Dentro da própria estrutura de atendimento é percebido que para as mulheres indígenas falta credibilidade nos processos conduzidos pelo estado. Outrossim, o aproximação aos serviços de saúde é mais difícil para comunidades cujos territórios ainda não foram reconhecidos, caso dos Akroá Gamella. 

Segundo o IBGE, no Maranhão, 28% das pessoas autodeclaradas indígenas não estão em territórios demarcados e, portanto, não são alcançadas pelo DSEI. Isso significa 15 milénio indígenas que seguem sem atendimento especializado.

O legista Diogo Cabral, da Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão (Fetaema), explica que os eventos, oficinas, rodas de conversa e momentos de escuta nas comunidades são espaços comuns de circulação de informação sobre as violências contra mulheres indígenas, mas não geram notificação ou dados oficiais. Isso porque, segundo as próprias indígenas, além do pânico, o aproximação aos sistemas de saúde e de justiça não costumam ser acolhedores com suas denúncias. 

A Instauração Vernáculo dos Povos Indígenas (Funai) informa que as denúncias chegam pelo Whatsapp da coordenação, mas com a equipe reduzida, dificulta o atendimento das demandas. Para todo o estado, são somente 9 Coordenações Técnicas Locais, que até o início de 2025 contavam com somente um profissional cada. Recentemente, a Coordenação Regional da Funai no Maranhão recebeu mais 10 servidores e agora conta, ao todo, com 24 profissionais. 

Segundo a coordenadora da Funai no Maranhão, Edilena Krikati, há um esforço para a manutenção do diálogo metódico com o Ministério Público, a Defensoria Pública e o Tribunal de Justiça do estado, porquê formas de prometer os direitos da população indígena.

Entretanto, a juíza Adriana Chaves, do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA), membro da Percentagem de Heterogeneidade do órgão, explica que as pessoas indígenas enfrentam dificuldades para acessar o sistema de justiça devido às barreiras linguísticas, e até de vestimentas que são exigidas para entrar nos tribunais. 

A partir das reivindicações por capacitação das equipes de atendimento às mulheres para as especificidades da população indígena, em 2025 a Secretaria de Estado da Mulher (Semu) realizou uma edição do programa “Comboio Maranhão para Todas”, em Grajaú, no sul do estado. A iniciativa alcançou profissionais que trabalham com mulheres indígenas na região. 

No TJMA, a juíza Adriana Chaves tem se mobilizado na ouvidoria para atender às questões indígenas. Ela enfrenta o duelo de realizar todas as atividades, desde a escuta, a sistematização das solicitações, até as propostas de mediação e formação para as equipes de atendimento.

Segundo Heliane Fernandes, secretária adjunta de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres da Semu, existe uma dificuldade em acessar dados precisos sobre violência contra mulheres indígenas tanto pela falta de notificação, quanto pela situação de vulnerabilidade em que as vítimas chegam à secretaria por meio das Casas da Mulher Maranhese. 

Para deslocar-se até os territórios de difícil aproximação e oferecer atendimentos jurídicos e de saúde em territórios, a secretária destaca o “Ônibus Delas” e a “Carreta da Mulher Maranhense”. Entretanto, o Ônibus está com as atividades suspensas desde 2024 para manutenção. Já a Carreta, apesar de se propor a levar os serviços aos territórios, não consegue chegar a alguns lugares, argumentando problemas com terrenos irregulares e falta de vontade trifásica nos locais. 

Outrossim, os serviços ofertados pela secretaria nem sempre contemplam as mulheres indígenas frente às suas necessidades específicas. É o caso, por exemplo, do “Aluguel Maria da Penha”, valor de R$ 600 que as mulheres em situação de vulnerabilidade por violência doméstica recebem para moradia. No caso das indígenas, e a relação construída com suas aldeias, forçá-las a trespassar de seus territórios seria mais uma violência. 

Resistência coletiva

Uma vez que forma de reagir ao aumento dos casos de violência, em 2025 o Instituto Makarapy, em parceria com o Ministério dos Povos Indígenas, realizou um encontro na Terreno Indígena Arariboia, onde ocorreram três dos quatro feminicídios de 2024. 

Foram 60 mulheres que levantaram pontos porquê: a geração de uma rede de atendimento às mulheres indígenas no Maranhão; a formação e discussão sobre a questão de gênero e a violência nas aldeias; a realização de um diagnóstico aprofundado sobre a situação da violência, com o esteio das universidades do estado; a geração de um dia de enfrentamento à violência contra as mulheres indígenas; e a geração de um parecer das mulheres indígenas. O relatório deverá ser ampliado quando as conferências forem realizadas nas demais Terras Indígenas do estado. 

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