Amigo e mestre escultor Moreira Neves
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Sebastião Pimenta
Professor e estatuário
Por imperativo de consciência, escrevo levante singelo requiem para revelar todo o meu apreço pelo meu companheiro e rabi estatuário Moreira Neves.
Nos últimos cinco anos partilhei com ele momentos altamente enriquecedores de originalidade, prazeres concupiscentes e da maior elevação cultural.
A sua personalidade uno e desconcertante revelava-se sempre um ótimo fomento ao tirocínio intelectual do contraditório, à degustação dum guloseima divinal, ao mais acutilante escrutínio do valor artístico de criativos famosos e menos populares, a um vislumbre mais sisudo de qualquer rebento botânico mais desapercebido ao olhar generalidade, enfim, um rol de experiências que se transformavam em lições de vida.
Porquê artista, foi o maior estatuário da Covilhã, com obra pública instalada em diversos lugares da cidade e no concelho, além de poder brotar noutros territórios, às vezes de modo inusitado (recordo uma estátua de tamanho considerável, numa farmácia, em Ponta Delgada, Açores).
Acresce o facto de ter vivido quase exclusivamente da estátua, instalando o seu ateliê na quinta das Sete Fontes, nas encostas da Serra da Estrela, com vistas largas sobre a cidade da Covilhã. Foi ali que passei a ser um dos seus aprendizes, onde recebi os melhores ensinamentos, e não só na arte de trabalhar o mármore (“Com preceito, Sebastião! Chega-te à pedra e corta com preceito” – dizia-me o rabi).
Acompanhei de perto a sua atividade nestes últimos cinco anos de vida. Pensei em ser porquê ele, viver da arte com persistência e a tempo inteiro. Mas, apesar de muito me ter devotado, a partir do momento em que ele adoeceu, faltou-me a sua companhia e o seu imprescindível esteio técnico. Que falta me fez! Que falta nos faz!
Lá na Serra, deixou grande segmento do seu espólio, e uma última estátua iniciada, à porta do ateliê das pedras, em mármore preto mate, pronunciando o porvir de um torso feminino em pose de sedução que, se fosse concluído, luziria nos seus olhos, depois de ser polido com delicadeza e incansável preceito.
Saudades eternas, rabi e companheiro!
O teor Amigo e mestre escultor Moreira Neves aparece primeiro em Jornal Notícias da Covilhã.
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