Mundos complexos / Visões simplistas

A Política é uma arte maior. Nós somos seres políticos. A nossa consciência de espécie é política. Os animais têm os comportamentos definidos por regras instintivas, nós criámos todo um sistema de organização, de relações possíveis, de noções de poder, abandonámos o instinto em alguma parte no tempo, o instinto foi derrubado pela força da cultura e da consciência, ganhou a Política. Não há zero na nossa vida, zero do que façamos, que não seja um acto político, até o silêncio.

Tudo é uma escolha e dessa escolha, ainda que possa não ser uma opção consciente, não há exoneração provável. É o preço de sermos seres sociais e de vivermos em Democracia. Somos livres em conjunto. Ninguém nasce sozinho, ninguém vive sozinho, a morte é outra questão.

Devíamos olhar muito mais para a História do mundo sem temor. Olhar descomplexadamente. Devíamos ser mais críticos. Já não temos a ilusão de que a evolução humana seja um caminho para a sublimidade, esses tempos já não existem desde as Grandes Guerras. Agora vivemos numa cronologia que salta entre estados, às vezes sentimos que estamos a marchar para a frente, outras vezes sentimos que estamos a marchar para trás, uma vez que somos todos diferentes não conseguimos chegar a um harmonia sobre o que é a frente e sobre o que é o trás. Mas nós não estávamos habituados a que isso fosse um problema, sempre foi da discussão que nasceram caminhos, discutir pontos de vista era uma das características da Democracia, logo discutir pontos de vista deveria ser uma responsabilidade social, devia ser aceite, devia ser respeitado, devia ser normal.

O pensamento único não deve ser um objectivo do mundo. Somos seres contraditórios. Só podem nascer futuros e soluções da nossa incongruência. Antes, que era tudo muito mais simples, as visões eram mais complexas, agora que as coisas são bastante mais complexas, as visões são muito mais simplistas. Procura-se a narrativa da superfície, vemos o traço grosso do gravura, a mancha, mas estamos tão habituados a situações planas que já não conseguimos olhar para elas de mais do que um lado. Isto é perigoso.

Estamos a permanecer uma vez que as máquinas. Talvez por estarmos excessivo tempo agarrados a elas. Vemos o mundo através de ecrãs e de frases escritas em ecrãs. As escolas transformaram-se em viveiros de executantes, já não se dão mecanismos para pensar. Vivemos para os números. As televisões procuram espectadores e lucro, as redes procuram visualizações e lucro, os governos procuram percentagens e lucro, os bancos procuram exclusivamente lucro, as empresas também, mas e nós? Onde estamos no meio disto? À procura de quem nos conforte.

Por isso estamos vulneráveis e desejamos profetas que nos apontem o caminho. Mas os profetas sabem uma vez que estamos e os profetas procuram o lado perverso do lucro: o Poder. Nunca vivemos tão perigosamente, nunca o término dos tempos esteve tão latente. Nunca o porvir esteve tão incerto, não um porvir de dificuldades, mas um porvir de sobrevivência da cultura. E escolhemos o quê?

De um lado está a peta, do outro está a peta e a loucura.

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